Na transição de governo, Geraldo Alckmin, Aloizio Mercadante e Fernando Haddad saíram em defesa de medidas de revisão de gastos e subsídios. A intenção era melhorar a eficiência da aplicação dos recursos arrecadados nas políticas públicas.
O governo eleito estava negociando a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, para aumentar de forma permanente em R$ 170 bilhões o patamar das despesas públicas. O discurso de revisão de gastos caía como uma luva para sinalizar que o ajuste fiscal não seria feito somente pelo aumento da arrecadação.
O cenário era de desconfiança com a direção que Lula imporia para a política econômica do seu terceiro mandato.
Alckmin chegou até mesmo, na primeira entrevista durante a transição, a falar que “todos” os gastos do governo seriam revisados.
Mais tarde, Simone Tebet assumiu o Ministério do Planejamento com o compromisso de reformular a estrutura de avaliação das políticas públicas já existentes para propor a revisão dos gastos.
Até então, o governo tinha toda uma sistemática de avaliação das políticas públicas, mas, a despeito das recomendações técnicas para a revisão do que era ineficiente, nada saiu do papel.
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Tebet contratou um dos maiores especialistas nesse tema do país, Sergio Firpo, para tocar esse trabalho. Prometeu reconstruir o Planejamento (classificado por ela de elefante lento e pesado) e fazer o possível para enfrentar os limites da agenda política de Lula para a revisão das despesas.
Pisando em ovos, a ministra não conseguiu avançar no primeiro ano do governo e deve encontrar uma barreira ainda maior em 2024, ano de eleições municipais.
Um sinal do que pode acontecer: esvaziamento do seu ministério, que foi recriado por Lula 3 para reerguer o papel do planejamento público e pensar as políticas públicas.
Na tentativa de sair desse círculo negativo, a proposta em estudo na área econômica é criar um programa formal de revisão de gastos a ser incluído na Lei de Diretrizes Orçamentárias e no Orçamento de 2025, como revelou a Folha.
Mas o enrosco é grande. Lula tem sido alertado sobre os riscos de comprar essa pauta com medidas que podem se tornar impopulares e levar a cortes de gastos.
A visão dos críticos é que pode haver um efeito recessivo sobre a atividade econômica.
Essa preocupação foi exposta de forma cristalina pelo cientista político André Singer, um dos principais estudiosos do lulismo.
Em entrevista à Folha, publicada no domingo, Singer disse que o arcabouço fiscal era um risco eleitoral para o governo Lula.
O temor apontado por ele era de que a redução no crescimento invertesse a sensação de bem-estar da população em 2024, gerando prejuízos para o governo nas eleições municipais, se estendendo até 2026.
O embate do primeiro ano do arcabouço é justamente esse, de ordem política. O medo de o ajuste exigido empurrar uma parcela da população para o bolsonarismo.
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A revisão de gastos precisa ser enfrentada até para remanejar espaço para a concessão de novos subsídios para novas tecnologias necessárias à transição energética da economia brasileira. Por que o Brasil tem que continuar gastando mal ou perdendo receita em coisas ruins?
Se uma determinada política se provar ineficiente, ela deve ser reduzida ou zerada. Até mesmo para reforçar as que são muito eficientes.
No Brasil, é difícil avançar nessa agenda porque tem sempre uma eleição à espreita.
Não falta diagnóstico do que fazer. Falta é decisão política de fazer.
Fica a pergunta no ar se Haddad vai apoiar Tebet na ideia de criar o programa de revisão de gastos e convencer Lula a encarar esse desafio.
Fonte: Folha de São Paulo