Os governantes eleitos em 2018 cumpriram 41% das promessas feitas para as mulheres brasileiras. Para marcar o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, a Lupa analisou 218 metas traçadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e pelos 27 governadores. Apenas 90 foram cumpridas. As propostas verificadas foram retiradas dos planos de governos submetidos por esses políticos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A maior parte das propostas não saiu do papel. Ao todo, 76 não foram cumpridas e outras 36 ficaram pela metade, ou seja, foram parcialmente cumpridas. Segundo a cientista política Camila Cassis, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é possível que algumas propostas tenham sido usadas, durante as eleições, apenas para marketing de campanha para garantir mais votos.
“As mulheres devem manter-se atentas para essas propostas não cumpridas e cobrar os governantes para que prestem contas a respeito das promessas feitas frente ao que realmente entregaram para a população. Precisa haver transparência com relação ao que foi prometido e ao que foi cumprido, também para que possamos saber quais são as dificuldades reais que se apresentam frente a determinados temas e políticas específicas”, afirma a especialista.
Das 218 propostas, 15 ainda estão em andamento e podem ou não ser terminadas até o fim do mandato. No Piauí, por exemplo, as obras de ampliação das estruturas de atendimento à saúde da mulher que foram prometidas começaram, mas ainda não foram concluídas.
Enquanto cinco estados definiram apenas uma meta — por vezes ampla — para as mulheres, como Amapá, Ceará, Rondônia, Tocantins e Rio Grande do Sul, o Rio Grande do Norte contou com 61 propostas, ou seja, 28% do total das metas de todos os governantes. Fátima Bezerra (PT), chefe do Executivo potiguar, foi a única mulher eleita governadora no pleito de 2018 e cumpriu, até o momento, 28 promessas.
Os governadores eleitos em Minas Gerais e Santa Catarina, Romeu Zema (Novo) e Carlos Moisés (Republicanos), não traçaram metas para as mulheres. Por essa razão, eles não aparecem na tabela anterior.
A segurança pública foi uma das grandes apostas dos governadores eleitos em 2018 para melhorar a situação das brasileiras, representando 28% do que foi prometido. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Pará, Paraná, Roraima, Espírito Santo, Acre e Rio Grande do Norte traçaram metas para ampliar e melhorar o serviço das Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher.
Apesar dos esforços, somente 25 das 61 promessas foram totalmente concluídas. Os casos de feminicídio em todo o Brasil bateram recorde no triênio 2019-2021. Em 2017 e 2018, foram 1.075 e 1.206 ocorrências em todo o país (página 108), respectivamente, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Já em 2019, quando novos governadores foram eleitos e reeleitos, os registros desse tipo de crime aumentaram para 1.328 e bateram recorde em 2020, chegando a 1.351. Apesar da queda registrada em 2021 em relação ao ano anterior, quando 1.319 mulheres foram vítimas de feminicídio, o número é maior do que o de 2018.
A promoção da saúde das mulheres foi o segundo tema com maior número de promessas, depois da segurança pública. Foram 54 metas no total e, de maneira geral, voltadas para a gestação, parto e amamentação. Em quatro estados (Pará, Pernambuco, Paraíba e Alagoas) foi estabelecida como meta a criação ou a inauguração de um Hospital da Mulher, uma unidade com serviços de saúde exclusivos para essa população. Apenas o governador do Alagoas, Renan Filho (MDB), concluiu o plano.
Apenas quatro governadores planejaram ações para mulheres na área de educação, um total de 12 promessas — das quais metade não foi cumprida. Os gestores do Acre, Bahia e Piauí fizeram uma promessa cada e as outras oito metas foram prometidas pela governadora Fátima Bezerra, do Rio Grande do Norte.
Embora a maior parte das pessoas que concluíram o ensino médio no Brasil seja mulher (51%), essa tendência não se repete na educação superior. Um levantamento feito por pesquisadores das universidades federais de Alagoas, Pernambuco e Santa Catarina mostrou que, das 184.728 bolsas outorgadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) entre 2010 e 2021, 64,7% foram para homens e 35,3% para mulheres.
Apenas o governador da Bahia, Rui Costa (PT), propôs criar um programa de mulheres nas ciências e ampliar a participação dessa população nas universidades e grupos de pesquisa. Essa promessa, no entanto, não foi cumprida. No Rio Grande do Norte, a chefe do Executivo estadual prometeu, entre outros pontos, eliminar conteúdos sexistas e discriminatórios dos materiais didáticos, além de valorizar a diversidade de gêneros — essa meta também não foi cumprida.
Segunda edição
A análise faz parte da segunda edição do SobreElas, realizado pela primeira vez em 2018. A Lupa verificou mais metas agora do que na primeira vez em que o projeto foi lançado. Em 2018, os checadores verificaram 46 promessas feitas por 21 governadores e 19 prefeitos das capitais. Naquela época, 15 metas não foram cumpridas, e outras cinco não foram cumpridas completamente.
Nota: esta reportagem faz parte do projeto SobreElas, produzido pela Lupa com apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil.
Fonte: Projeto SobreElas, produzido pela Lupa da Folha de S. Paulo