O Instituto Carlos Chagas, da Fiocruz Paraná, confirmou que o vírus zika, hoje apontado como a principal hipótese para o aumento de casos no país de bebês com microcefalia, é capaz de atravessar a placenta durante a gestação.
A pesquisa inédita foi feita a partir de amostras de uma paciente do Nordeste que sofreu um aborto retido – quando o feto deixa de se desenvolver dentro do útero – durante o primeiro trimestre de gravidez.
A suspeita surgiu após a gestante informar ter tido sintomas de zika, como manchas vermelhas no corpo. A partir daí, amostras da placenta passaram por exames capazes de verificar a infecção por vírus do mesmo gênero do vírus zika. Também foram feitos testes moleculares que identificaram o genoma do vírus zika em células da mãe e do embrião.
Segundo a virologista Cláudia Nunes Duarte dos Santos, que participou da análise, o achado confirma a transmissão do vírus via placenta. “É muito grave, e confirma a nossa suspeita. É a primeira vez que vemos o RNA [do vírus da zika] no tecido da placenta”, diz a pesquisadora, uma das primeiras a identificar o vírus zika no Brasil.
Exame morfológico também mostrou uma inflamação da placenta, de acordo com a patologista Lúcia de Noronha, professora de medicina na PUC-PR, que verificou amostra. “Dá para ver claramente que o vírus rompeu essa barreira”, diz.
TRANSMISSÃO
Além da confirmação da presença do vírus na placenta, pesquisadores também verificaram os primeiros indícios de como seria um caminho possível do vírus zika durante a transmissão.
A hipótese dos pesquisadores que analisaram as amostras é que o vírus utiliza a capacidade migratória dessas células para alcançar os vasos fetais um mecanismo semelhante ao observado em transmissões de HIV, segundo Lúcia de Noronha.
Análises anteriores já sugeriam que o vírus zika pudesse atravessar a placenta e infectar o feto, mas faltavam dados que pudessem esclarecer essa transmissão, afirma.
Em uma delas, feita pelo Instituto Oswaldo Cruz, da Fiocruz, pesquisadores verificaram a presença do vírus em amostras do líquido amniótico de duas gestantes da Paraíba, cujos fetos foram identificados com microcefalia ainda antes de nascer.
Para Santos, a presença do vírus na placenta tanto em células da mãe quanto do embrião acaba por complementar as análises anteriores. “Isso mostra que o vírus tem potencial de fazer infecção congênita” diz.
Identificado no país há menos de um ano em testes com amostras de pacientes do Nordeste, o vírus zika se espalhou e já tem circulação confirmada em 21 Estados do país e Distrito Federal.
De acordo com o infectologista Kleber Luz, do Rio Grande do Norte, embora o caso em estudo não envolva a microcefalia, o resultado reforça a possibilidade de o vírus estar relacionado ao aumento de registros de malformações em bebês. “É mais uma prova do que o vírus zika pode causar”, afirma.