Na sexta-feira, dia 29, uma postagem na página Spotted PUCRS no Facebook denunciou um caso de assédio verbal sofrido por estudantes do curso de Nutrição da universidade em uma visita à Ceasa. Segundo o relato, funcionários gritavam cantadas de cunho sexual para as alunas que andavam pelo pavilhão e a professora que acompanhava pediu apenas para as jovens ignorarem, apenas interferindo quando a situação gerou uma briga entre um funcionário da Ceasa e um aluno.
O episódio chamou atenção para um dos ataques mais comuns sofridos pelas mulheres diariamente, o assédio verbal. E um dos que é levado menos a sério: afinal, o que tem de tão horrível em levar uma cantada na rua?
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– As famílias não ensinam os filhos a serem respeitosos e educados com as mulheres. É um absurdo que um homem possa proferir qualquer tipo de gracejo para uma desconhecida na rua; mesmo que ele ache que está elogiando, é um desrespeito – reflete a professora da Faculdade de Educação da UFRGS Jane Felipe de Souza, integrante do Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero (GEERS). – É uma questão de gênero, de educação: os homens são ensinados que podem fazer absolutamente tudo. Por sua vez, as mulheres são educadas para achar que isso é normal e até mesmo lisonjeiro, o que não é.
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O número de assédios verbais é pelo menos cinco vezes maior do que as outras formas e as “cantadas” mais ouvidas são os clichês “gostosa” e “ô lá em casa!”. As informações são do aplicativo Sai Pra Lá que recebe denúncias de situações de assédio com o local e horário em que aconteceram. O objetivo é conhecer os casos no país para motivar campanhas e ações preventivas. Segundo a criadora do app, Catharina Doria, o aplicativo já recebeu entre 25 e 30 mil denúncias de assédios verbais desde que foi criado, em novembro do ano passado.
– O assunto e o problema são claros, mas ninguém quer resolver na raiz. Todo mundo acha que é cotidiano, é sempre assim, as pessoas falham em resolver a situação. Está faltando seriedade – comenta Catharina, argumentando que todas as empresas e universidades deveriam ter palestras sobre os diferentes tipos de assédio no início do ano.
Outras formas de combater o assédio sexual em espaços públicos também mostram números igualmente preocupantes. A campanha Chega de Fiu Fiu do coletivo Think Olga, lançada em 2013, fez uma pesquisa na época em que 99,6% das quase 8 mil mulheres entrevistadas disseram ter sido assediadas com cantadas na rua. No site da campanha, é possível fazer uma busca por cidade e descobrir onde e como ocorreram casos em diferentes pontos. Em Porto Alegre, há concentração clara de denúncias na área central.
Ainda em fase de desenvolvimento, o aplicativo Metendo a Colher, criado pela pedagoga Rafaela Melo, integrante do GEERS, tem o objetivo de apresentar por meio de mapas dados da violência de gênero no Rio Grande Do Sul com o objetivo de promover debates e discussões no espaço escolar sobre a violência contra mulher. Utilizando dados da Secretaria de Segurança Pública e denúncias, o aplicativo divide os casos em categorias de violência: feminicídio (tentativa e consumado), ameaça, lesão corporal e estupro.
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Para Jane Felipe, o grande problema é a forma como se enxerga o assédio, principalmente o verbal.
– Esse comportamento não é visto como tão invasivo como deveria ser. As mulheres precisam enxergar essas cantadas não como elogiosas, mas extremamente invasivas e desrespeitosas – comenta Jane, destacando que este tipo de comportamento está baseado em uma condição machista que acredita que os homens têm direito de assediar as mulheres de várias formas.