RIO — Para estudar os impactos das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, lutar contra a desigualdade e preconceito de gênero no campo científico, zarpa nesta sexta-feira, de um porto em Ushuaia, na Argentina, a maior expedição antártica formada apenas por mulheres. São 76 cientistas, de diversas nacionalidade, que enfrentarão temperaturas abaixo de zero numa jornada de 20 dias no continente gelado.
De acordo com estatísticas da Unesco, as mulheres representam apenas 28% de todos os pesquisadores no mundo, e são particularmente sub-representadas em nível sênior. Além disso, lideranças femininas são necessárias para combater as mudanças climáticas, que afetam desproporcionalmente as mulheres, disse Fabian Dattner, cofundadora da iniciativa Homeward Bound, que promove a expedição.
— A Mãe Natureza precisa das suas filhas — disse Fabian, à agência Reuters.
Em países da África subsaariana, muitos dos pequenos produtores agrícolas, um dos grupos mais afetados pela piora nas secas relacionada com as mudanças climáticas, são mulheres. Em outras partes do mundo em desenvolvimento, mulheres e garotas serão obrigadas a andar por distâncias maiores para conseguir água. Segundo um estudo de 2007, da London School of Economics, os desastres naturais, que se tornarão mais frequentes, matam mais mulheres do que homens.
Fabian conta que decidiu lançar a iniciativa após ouvir um grupo de cientistas polares contando piadas dizendo que os pesquisadores candidatos precisam de barba para ocupar um cargo de liderança no campo científico sobre a Antártica.
— A mensagem da Homeward Bound é reunir esse grupo de mulheres capazes e inteligentes que não são vistas, não são reconhecidas e, muitas vezes, são deixadas de fora — disse Fabian.
Segundo as participantes, muitas delas experienciaram algum tipo de assédio sexual, discriminação e misoginia durante a carreira. A ecologista marinha britânica Raeanne Miller contou que houve solidariedade entre as colegas enquanto elas trocavam histórias sobre as dificuldades que enfrentavam no mundo acadêmico e no balanceamento entre a vida pessoal e profissional.
— Na ciência, às vezes é difícil sair do foco da pesquisa e ampliar a perspectiva — disse Raeanne. — É comum você sentir que é a única a experimentar o que está enfrentando.
Essa é a primeira ação da iniciativa Homeward Bound. O objetivo é envolver 1.000 pesquisadoras durante uma década, para criar uma rede de cientistas mulheres.
— Nós temos que reconhecer que como mulheres, nós somos mais fortes juntas — disse Fabian.
Fonte: O Globo