O medo da dor, falta de controle durante o parto, aumento das chances de viver… A América Latina lidera o ranking de casos de cesarianas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS)
Na região, segundo a OMS, 38,9% dos nascimentos são resultados de uma cesariana, bem acima do recomendado de 10 a 15%. E este número está aumentando, colocando em risco milhares de mães e recém-nascidos.
“Nada justifica essa enorme quantidade de cesarianas”, disse Bremen de Mucio à AFP, médico e especialista em saúde sexual e reprodutiva da OMS para a América Latina.
O maior número de cesarianas é realizado no Brasil, onde quase 56% dos partos do sistema público foram cesarianas no ano de 2011. Já no caso dos partos realizados com plano de saúde, cerca de 85% são cesareas. Os resultados ainda mostram que as cesarianas são mais frequentes entre as adolescentes, resultado que preocupa os pesquisadores.
Na Europa, onde o parto natural é mais valorizado e muitas vezes realizado sob a supervisão de uma parteira em vez de um médico, a taxa é de 24%, contra 33% nos EUA, de acordo com um relatório publicado em 2014 pela OMS.
Os países pobres
Países muito pobres, como o Haiti, têm níveis muito baixos (5,5%), devido à dificuldade de acesso aos cuidados de saúde. Em outros países, cuja grande maioria da população é de origem indígena, o parto natural é favorecido. Entretanto, mesmo nessas localidades, o parto cesariano vem ganhando espaço.
Na Bolívia, as cesarianas aumentaram de 14,6% para 19% entre 2008 e 2012. No Peru, o número subiu de 15,8% para 25%. Na República Dominicana, os partos cesáreos atingem 44% dos nascimentos, na Colômbia 43%, no México 39% e no Chile 37%.
“Em muitos países em desenvolvimento e desenvolvidos há realmente uma epidemia de cesarianas, mesmo quando não é necessário”, criticou recentemente o Dr. Marleen Temmerman, diretor do Departamento de Saúde Reprodutiva e Pesquisa da OMS, em Genebra.
Agora, após esta intervenção, o risco de morte materna é multiplicado por oito, e o risco do recém-nascido de desenvolver uma doença respiratória é multiplicado por 120.
Múltiplos fatores
Embora a situação seja clara, a explicação não é tanto. “Há muitos fatores, e é esse o problema ao tentar resolver esta situação”, disse Bremen de Mucio.
“O aumento não tem nada a ver com uma necessidade médica, mas sim com a equipe médica está mais preocupada com o seu conforto do que com o bem-estar das mulheres”, diz Ana Quiros, diretora do centro de informação e serviço Saúde na Nicarágua, que tem uma das mais altas taxas de cesarianas na América Central (30%).
“Mesmo quando o preço é o mesmo, o tempo que leva que uma cesariana será sempre mais rentável que um parto natural profissional”, acrescenta o Dr. De Mucio. O parto pode durar até 24 horas. Ao mesmo tempo, podemos fazer várias cesarianas, disse.
A crescente integração das mulheres no mercado de trabalho, o forte crescimento econômico na região nos últimos 15 anos, o medo da dor durante um parto tradicional, e gravidez tardia são também fatores que levam ao aumento do número de cesarianas.
Medo e dor
“Eu escolhi dar à luz ao meu filho por cesariana, porque eu estava com medo do parto natural. Especialmente da dor e de sofrer por muito tempo”, reflete Luana Martines, 26, designer de interiores no Rio de Janeiro que deu à luz em uma clínica particular.
O excesso de precaução da equipe médica e das famílias para minimizar os riscos judiciais joga contra o parto natural. Em todo mundo, a prática de ginecologia é a mais sujeita a processos legais.
“Sob o pretexto da segurança, muitos médicos dizem: ‘Eu não posso deixar que as mulheres deem à luz na minha clínica depois das 14:00, porque neste momento já não há nenhum especialista. Dessa forma, eu tenho de fazê-las dar a luz antes ‘”, relata Dr. De Mucio.
Medidas como a obrigatoriedade de uma segunda opinião médica ou fornecimento de melhores informações às pacientes sobre os riscos, são, no momento, ineficazes.
Fonte: Cria Saúde