A cantora Elza Soares morreu nesta quinta-feira (20/01) no Rio de Janeiro, aos 91 anos. Segundo Pedro Loureiro, empresário da artista, em um post do Instagram, a morte foi por causas naturais e ocorreu às 15h45.
Considerada uma das maiores cantoras da música brasileira, Elza Soares continuou com a carreira ativa, com planos de shows e discos de músicas inéditas, até o final da vida.
“A amada e eterna Elza descansou, mas estará para sempre na história da música e em nossos corações e dos milhares fãs por todo o mundo”, diz a postagem do empresário.
“Feita a vontade de Elza Soares, ela cantou até o fim.”
O velório está previsto para esta sexta-feira (21) no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Em entrevista ao site de notícias G1, Loureiro disse que Elza estava bem nos últimos dias, tendo gravado um DVD em 17 e 18 de janeiro. Nesta quinta-feira (20), ela seguiu sua rotina normalmente até sentir um certo cansaço, apresentar uma respiração mais ofegante e a fala mais enrolada.
Apesar de dizer às pessoas próximas que estava se sentindo bem, o empresário relatou que a cantora disse aos familiares: “Acho que eu vou morrer”.
Uma ambulância foi chamada, mas Elza morreu antes.
“Foi uma morte tranquila, sem traumas, sem motivo. Morreu de causas naturais. Esse, aliás, era um grande medo dela: ter uma morte sofrida, por doença. Hoje, ela simplesmente desligou”, disse Pedro Loureiro ao G1.
A cantora faleceu no mesmo 20 de janeiro em que Garrincha, com quem foi casada, morreu de cirrose hepática, em 1983.
Em janeiro de 2021, a BBC produziu o especial A Rainha Invencível do Samba, dedicado a Elza Soares. Confira aqui (em inglês).
O programa tem uma entrevista com Elza, que comentou diversas passagens de sua vida e carreira.
Vida
Nascida Elza da Conceição em um sítio de Padre Miguel, bairro da zona oeste do Rio, a cantora teve uma infância pobre em Água Santa. Trabalhou como faxineira, empacotadora e doméstica.
Casou-se aos 12 e foi mãe aos 13. O sobrenome Soares vem do primeiro marido.
Um de seus filhos morreu em decorrência de uma pneumonia. Foi justamente em um momento de desespero para comprar remédios contra a doença que ela se inscreveu no programa Calouros em Desfile, de Ary Barroso, na Rádio Tupi.
Com vestimentas improvisadas, sustentadas por alfinetes em seu corpo magro pela pobreza, Elza foi alvo de uma pergunta irônica do famoso apresentador e compositor de Aquarela do Brasil: “De que planeta você veio, minha filha?”.
“Do planeta fome”, ela respondeu.
O episódio rendeu o título do 34º e disco final da carreira de Elza, Planeta Fome (2019).
Em uma entrevista à BBC News Brasil em 2018, ela contou: “Sempre gostei de cantar, desde pequenininha. Ser cantora na época era uma coisa pejorativa. Meu pai queria que eu estudasse muito, que não falasse em ser cantora”.
Ela ganhou o prêmio do programa de Ary Barroso, com a nota máxima, ao interpretar o samba-canção Lama. Com a vitória, Elza conseguiu comprar os medicamentos contra pneumonia, mas um de seus filhos não resistiu.
A data de nascimento de Elza sempre foi envolta em mistério. Tanto o dia (23 de junho ou 22 de julho) quanto o ano (1930 ou 1937). Nem para seus biógrafos ela esclareceu a questão.
“Não se pergunta sobre idade a mulher. Esse negócio de idade… não tem idade, cara. Sou atemporal”.
Os 91 anos são citados no post que anunciou sua morte.
Relação com Garrincha
Aclamada por seu talento musical em diversas fases da carreira, Elza Soares também ganhou notoriedade formando um casal-celebridade ao lado de Garrincha, um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro.
O relacionamento, iniciado quando Garrincha ainda era casado com outra mulher, foi condenado pela conservadora opinião pública da época – levando os dois a se mudarem para Roma.
A turbulenta relação que durou 17 anos teve um conhecido episódio de violência doméstica. Agredida pelo jogador, que era alcólatra e enfrentava uma derrocada financeira, ela preferiu não denunciar o caso à polícia.
Mas faz referência a esse período na música Maria da Vila Matilde, que aborda o feminicídio, com o verso “Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim”.
“A violência doméstica, por mais que você fale e tente combater, ainda é muito presente. É triste que você ainda tenha a necessidade de fazer músicas falando da violência contra a mulher, que é uma coisa horrível. Isso você vai ter que falar a vida toda? É um câncer, né?”, disse a cantora à BBC News Brasil.
Garrincha morreu aos 39 anos em 1983. Um filho do casal, Garrinchinha, morreu em um acidente de carro três anos depois.
“Eu penso nos momentos de amor. Procuro esquecer os momentos de ódio, porque a coisa pior do mundo é o ódio, né? Então penso no momento de amor, que foi lindo.”
A cantora também falou sobre como superou diversos obstáculos ao longo da vida. “Garra. Vontade. Entendeu? Acreditar. Tudo isso você tem que ter contigo. Eu acredito. Eu tenho garra. Eu tenho persistência. Eu acho que isso faz acontecer”, disse.
Reinvenção constante
Em 1999, a Rádio BBC elegeu Elza a cantora brasileira do milênio, dentro do projeto The Millennium Concerts, criado para celebrar a chegada do novo milênio.
Apesar das décadas de carreira e dos sucessos acumulados, uma das marcas de Elza era não se prender ao passado e procurar voos artísticos diferentes a cada novo álbum.
Especialmente no novo milênio. Em 2002, gravou o aclamado Do Cóccix Até o Pescoço ao lado do compositor José Miguel Wisnik.
No ano de 2016, a cantora ganhou o Grammy de melhor álbum de música popular brasileira com A Mulher do Fim do Mundo, disco que trabalhou tanto sonoridades quanto temas contemporâneos e que recebeu grandes elogios da crítica.
Ela comentou sobre a sua constante reinvenção durante toda a carreira: “My name is now (“meu nome é agora”). E deixa o futuro vir. Como deveria ser. O passado já foi”.
Fonte: BBC