As estatísticas sobre participação feminina no mercado de trabalho já não eram boas, com a pandemia ficaram ruins e, agora, há indícios de que podem piorar.
Um estudo da consultoria PwC divulgado na última segunda-feira (7) – véspera do Dia Internacional das Mulheres – mostrou que a transição energética e os esforços de descarbonização empreendidos pelas companhias podem ter o efeito colateral de agravar ainda mais as disparidades profissionais entre homens e mulheres.
Segundo o relatório, a jornada rumo a um modelo econômico mais sustentável vai criar milhões de empregos ao redor do mundo. No entanto, projeções indicam que essas novas vagas estarão concentradas em setores predominantemente masculinos, como construção, indústria e serviços públicos.
A menos que governos e empresas invistam em intervenções direcionadas, a tendência é que, até 2030, existam ainda mais homens empregados do que mulheres, já que eles estarão em melhor posição para aproveitar as oportunidades.
O estudo examinou a mudança na composição dos empregos em países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), como resultado dos avanços em sustentabilidade energética. Foram considerados efeitos em empregos diretos e indiretos, calculados com base nos dados da Organização Internacional do Trabalho.
Um dos exemplos citados é a transição dos combustíveis fósseis para fontes renováveis.
Caso os compromissos de zerar emissões líquidas de carbono (net zero) assumidos por países e empresas sejam levados a sério, é de se esperar que os empregos em refinarias de petróleo diminuam, enquanto as vagas para engenheiros de turbinas eólicas ou técnicos de painéis solares aumentem.
“Se nada for feito para aumentar a representação das mulheres nesses setores de crescimento, estimamos que a diferença de emprego entre homens e mulheres na OCDE aumentará 1,7 ponto percentual até 2030, passando de 20,8% em 2020 para 22,5% em 2030”, diz o relatório.
Para Luciana Medeiros, sócia da PwC Brasil, os resultados não surpreendem. “Há uma preocupação de que as novas posições que vão aparecer no contexto do net-zero tragam uma desvantagem de gênero, porque ocorrerão em segmentos que hoje já têm uma concentração maior de homens”, afirma
O estudo da PwC considerou apenas a transição verde no setor energético, que é responsável por aproximadamente 35% das emissões de gases de efeito estufa globais.
Embora o Brasil não esteja incluído nos dados e tenha uma matriz energética considerada mais limpa do que boa parte dos países da OCDE, Medeiros não antecipa um cenário muito diferente por aqui.
Segundo ela, o país tem uma grande fragilidade em relação às questões de gênero, o que ficou ainda mais exposto durante a pandemia.
A executiva ressalta que a realidade brasileira tende a ficar em desvantagem na comparação com esses países, especialmente quando se trata de temas sociais.
Um dos motivos é a correlação entre raça e gênero. O relatório mostra que os desafios no mercado de trabalho são ainda maiores para mulheres negras e de minorias étnicas –o que deixa o Brasil numa posição ainda mais delicada.
Mulheres têm desvantagem em empregos verdes O prognóstico sobre a participação feminina em profissões ligadas à sustentabilidade é ruim, mas o prejuízo pode ser percebido desde já.
Uma outra pesquisa feita pela PwC em 2021 mostrou que as mulheres se sentem menos preparadas que os homens para aceitar aceitar essas vagas.
Os chamados empregos verdes são aqueles que ajudam a melhorar a eficiência no uso de energia e matérias-primas; limitar emissões; minimizar resíduos e poluição; proteger e restaurar ecossistemas; e apoiar a adaptação aos efeitos das mudanças climáticas.
Segundo o levantamento, as mulheres têm pior desempenho em todos os quesitos avaliados. Elas trabalham em menos empregos verdes, possuem menos habilidades necessárias para uma vaga e não estão cientes das novas oportunidades.
O diagnóstico endossa a projeção de que, sem iniciativas específicas, a transição para o net-zero aumentará a diferença entre o número de homens e mulheres empregados.
Transição sustentável deve ser feita com políticas de gênero Luciana Medeiros afirma que as empresas precisam aprender com os erros da pandemia na hora de enfrentar as mudanças climáticas. Na visão dela, a elaboração de políticas que garantam a permanência e o acesso ao emprego são fundamentais.
Uma das formas de fazer isso é reconfigurando o mundo do trabalho para atender melhor às necessidades femininas –oferecendo mais flexibilidade, por exemplo.
O estudo da PwC também cita outras políticas importantes para equilibrar as oportunidades, como opções de cuidados infantis mais acessíveis para ajudar a reduzir o fardo dos cuidados não remunerados realizados pelas mulheres, e políticas de licença parental igualitária.
No outro lado da equação, surge a necessidade de municiar as mulheres com as habilidades certas para o mercado de trabalho do futuro.
“O que temos hoje no setor privado é uma mudança de olhar em direção a políticas que contemplam as questões de gênero, raça e diversidade. Mas, mesmo assim, nós continuamos vendo muita discrepância”, afirma.
Fonte: Folha de S. Paulo