Com a morte do Papa Francisco, no último domingo, 21 de abril, encerra-se um pontificado marcado por gestos concretos em favor da inclusão das mulheres na estrutura da Igreja Católica. Durante seus 12 anos à frente do Vaticano, Francisco fortaleceu a presença feminina nos bastidores do poder e abriu caminhos simbólicos até então inéditos — ainda que tenha mantido intacta a barreira histórica da ordenação sacerdotal.
Desde o início de seu pontificado, em 2013, o papa argentino deixou claro que desejava ampliar a atuação das mulheres na Igreja. E assim o fez: cargos antes restritos a homens começaram a ser ocupados por mulheres. Em uma década, o número de funcionárias no Vaticano cresceu de 846 para 1.165, representando um quarto do total de empregados da Santa Sé.
Mas o gesto mais emblemático veio em 2021, quando Francisco alterou o Código de Direito Canônico para permitir que mulheres exercessem, de forma oficial, os ministérios do Leitorado e do Acolitado — podendo assim ler a Bíblia e distribuir a comunhão durante a missa. A mudança institucionalizou uma prática até então informal em muitas paróquias do mundo.
No mesmo ano, nomeou a freira Nathalie Becquart como subsecretária do Sínodo dos Bispos, com direito a voto. Foi a primeira vez que uma mulher teve voz ativa nas decisões de uma assembleia sinodal — um passo histórico no espaço deliberativo da Igreja. Em 2023, outras 54 mulheres votaram ao lado de bispos, cardeais e religiosos na Assembleia Geral Ordinária do Sínodo, um sinal claro da mudança em curso.
Francisco também promoveu mulheres a postos de liderança antes inimagináveis. Raffaella Petrini se tornou secretária-geral do Governatorato, órgão que administra o Estado do Vaticano. Em 2025, foi nomeada presidente da Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano. E a freira Simona Brambilla passou a chefiar o Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada — tornando-se a primeira mulher a comandar um dos departamentos centrais do Vaticano.
Apesar das aberturas, o pontífice se manteve firme em sua posição contrária à ordenação de mulheres ao sacerdócio. Ainda assim, ele promoveu dois grupos de estudo para discutir a história do diaconato feminino — ambos sem consenso. Em entrevistas e documentos, Francisco reiterou que a mulher tem papel essencial na Igreja, mas “diferente, não ministerial”, como afirmou em 2024.
“Ajudemo-nos mutuamente, sem forçar e sem rasgar, mas com cuidadoso discernimento, dóceis à voz do Espírito e fiéis em comunhão, a encontrar caminhos adequados para que a grandeza e o papel das mulheres sejam mais valorizados no Povo de Deus”, pediu Francisco na Conferência Internacional Mulheres na Igreja, no Vaticano.
Em seu livro Vamos Sonhar Juntos (2020), o papa sintetizou sua visão: “O desafio tem sido criar espaços nos quais as mulheres possam liderar, moldar a cultura, e serem respeitadas e reconhecidas”.
Francisco não rompeu com a tradição do sacerdócio exclusivamente masculino, mas sem dúvida mexeu em estruturas centenárias, abriu portas e confiou a mulheres cargos-chave. Deixa como herança um chamado à valorização do feminino na Igreja, e a certeza de que sua contribuição para um futuro mais igualitário permanece como semente viva entre os fiéis.
Fonte: CNN Brasil