Iniciativa ocorre a poucos dias de Lula decidir se veta ou sanciona projeto aprovado pelo Senado
A alguns dias do prazo para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetar ou sancionar o novo marco temporal, movimentos sociais e lideranças indígenas, entre elas, a ministra Sonia Guajajara (Povos Indígenas) e a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), atuam em diversas frentes para tentar evitar reveses para os povos indígenas. O corpo a corpo ocorre nos Três Poderes.
Além de uma ofensiva mais consistente sobre o Executivo nessa reta final em que o presidente dará a palavra final sobre a proposta aprovada no Congresso Nacional, outras estratégias já estão bem desenhadas para que articulações sejam feitas no Legislativo e no Judiciário. Lula tem até sexta-feira para tomar uma decisão sobre o texto.
Apesar do alinhamento do presidente com a pauta, a expectativa é que ele vete apenas alguns trechos do texto. Evitar o veto integral seria estratégico para não enfrentar uma reação de bancadas temáticas, como a ruralista, que poderiam voltar a paralisar os trabalhos do Parlamento.
Pela tese do marco temporal, os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.
Há dúvidas, no entanto, se a aprovação de um projeto de lei terá força para fazer frente ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou a tese inconstitucional. A aprovação do projeto no Senado foi uma reação ao STF, apoiada principalmente pela bancada ruralista.
Em uma ofensiva sobre o Planalto, os movimentos sociais estão recorrendo a artistas e preparam um abaixo-assinado contra a matéria aprovada por deputados e senadores. A iniciativa que visa pressionar Lula a optar pelo veto integral já tem o respaldo de mais de 900 mil pessoas. O documento deve ser encaminhado ao presidente e para alguns ministros nos próximos dias.
A mobilização da classe artística já foi utilizada durante a tramitação do projeto no Congresso. Apesar do potencial limitado de mudança de placar, essa estratégia já foi determinante em alguns momentos para o adiamento da apreciação.
Na segunda-feira (16), o ministro da Secretaria de Relações Institucionais (SRI) da Presidência da República, Alexandre Padilha (PT), evitou ser taxativo sobre a possibilidade de Lula optar pelo veto integral. O auxiliar do petista enfatizou que o presidente tem “compromisso” com os direitos dos povos indígenas e criticou o fato de o texto ter sido aprovado com diversos “penduricalhos”.
“Não tenho dúvidas: o presidente tem compromisso com os direitos dos povos indígenas e compromisso com a Constituição brasileira. Então, a postura do presidente sempre será de compromisso com os direitos dos povos indígenas, com a proteção das terras indígenas, que não são terras dos indígenas, são terras do povo brasileiro, do patrimônio brasileiro. O projeto aprovado na Câmara tem uma série de penduricalhos que agridem inclusive terras já demarcadas, identificas como terras indígenas”, disse Padilha a jornalistas.
Ofensiva inclui bancadas e mobilização digital
Em paralelo à iniciativa no Executivo, Sonia e Célia encabeçarão uma ofensiva em relação às bancadas partidárias a partir desta semana. Até mesmo as temáticas devem ser acionadas, inclusive os ruralistas. A ideia é garantir votos para a manutenção dos eventuais vetos de Lula ao marco temporal.
“Vamos dialogar com todos os setores, com todas as bancadas. Guerra no campo não interessa a ninguém”, disse Célia ao Valor. “Faremos um novo apelo à sociedade para pressionar deputados e senadores a votarem pelo respeito aos direitos dos indígenas”, acrescentou.
Também manterão a mobilização digital que foi determinante para a diferença do placar entre as votações no plenário da Câmara do requerimento de urgência e do mérito do marco temporal. Em 24 de maio, os deputados aprovaram requerimento para que o texto tramitasse diretamente no plenário da Câmara e não precisasse passar por comissões. A urgência foi apoiada por 324 deputados, enquanto 131 foram contrários.
Uma semana depois, em meio a pressão de movimentos sociais, de artistas e dos povos indígenas, o mérito avançou com um placar menos elástico – 283 votos a 155. Esse corpo a corpo no Legislativo, porém, deve evitar inflamar os ânimos de bancadas organizadas como a ruralista, que teve atuação determinante para forçar a aprovação do marco temporal no Senado. Na ocasião, o grupo estava encabeçando uma obstrução que paralisava os trabalhos do Congresso.
O movimento só foi desmobilizado após pautas de interesse dos ruralistas serem colocadas em votação, entre elas, o marco temporal na Casa comandada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Em um horizonte um pouco mais distante, já há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) bem avançada para ser apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Corte declare inconstitucional pelo menos uma parte da decisão do Legislativo.
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