A denúncia da estudante universitária Franciane Andrade, 23, de que relatou ter sido dopada e estuprada durante o rodeio em Jaguariúna (SP), no último final de semana de novembro, causou grande comoção nas redes sociais após ela postar seu relato no Instagram. Em seus stories, ela mostrou ter percorrido o mesmo caminho difícil de outras vítimas de estupro: delegacia, hospital, IML (Instituto Médico Legal). O caso será investigado pelas autoridades policiais de Jaguariúna como estupro de vulnerável, quando a vítima não pode oferecer resistência.
Franciane não tem qualquer lembrança sobre o que ocorreu. A jovem só tornou o caso público depois de sentir dores, procurar um médico e, então, descobrir ter sofrido violência sexual. “Não sabia que tinha sido violentada”, disse ela em seus stories no Instagram. “Isso tudo é um pesadelo”, afirmou a jovem, visivelmente abalada. Mesmo assim, decidiu denunciar o crime. Fez o que especialistas em direitos das mulheres orientam, ainda que não haja mais detalhes sobre a violência relatada.
“Ela dá um exemplo para que outras mulheres também consigam denunciar”, afirma a advogada Andressa Cardoso, especialista em violência contra a mulher. “Agora, inclusive, o evento poderá corroborar com outras provas, imagens, filmagens. Provavelmente a autoridade policial deve entrar em contato para pedir que eles apresentem essas provas”, explica.
Por que é importante denunciar mesmo que a vítima não se recorde do crime?
Segundo a advogada, um dos aspectos mais importantes da denúncia nesse tipo de crime é justamente a possibilidade de se colher mais provas com a abertura da investigação. A organização do evento afirmou em nota enviada a Universa que já está analisando as imagens de câmeras de segurança.
Além disso, pode ser o caso de o mesmo agressor ter feito outras vítimas. “Em conjunto com mais notícias de crime, é possível que as autoridades consigam cruzar informações e chegar no autor. Infelizmente, muitas deixam de efetuar a denúncia, pois o desgaste que traz é imenso, além da própria dor que sentem”, ressalta.
A advogada afirma também que o delito de estupro de vulnerável é um crime que, normalmente, deixa vestígios, como material genético do agressor e substância usada para dopar a vítima. “Quanto antes forem feitos os exames, melhor”, diz.
“Além disso, ela deve ir ao hospital para tomar o coquetel de prevenção não só de infecções sexualmente transmissíveis, como também para evitar eventual gravidez”, afirma. “E ajuda muito contar com uma rede de apoio, como família, amigos e profissionais de saúde. São pessoas fundamentais para auxiliar a vítima após o ocorrido”, afirma, destacando a importância de se cuidar da parte psicológica da mulher.
Como explica a médica e sexóloga forense Mariana da Silva Ferreira, especialista em violência sexual, nos casos de estupro em que é usada uma substância que altere a cognição da mulher, o episódio costuma ser seguido de “um grande desconforto pelo fato de a vítima não saber o que exatamente fizeram com seu corpo”. “Além disso, há a incerteza se houve estupro coletivo, se houve registro de imagem ou vídeo da violência. Isso gera uma ansiedade e até mesmo pânico”, diz.
Em relação aos efeitos das substâncias usadas, a médica Rita de Cassia Bomfim Leitão Higa, legista aposentada do IML (Instituto Médico Legal) e professora de Toxicologia e Medicina Legal da Unoeste (Universidade do Oeste Paulista) afirma em entrevista a Universa que os efeitos, no geral, duram poucas horas, sem outras consequências posteriores.
“As substâncias empregadas para dopar pessoas fazem com que elas fiquem confusas, com sua capacidade de discernimento e julgamento alteradas, também apresentando dificuldade de autodefesa e em recordar dos fatos ocorridos. A duração dos efeitos depende de uma série de fatores, como associação com outros compostos, quantidade utilizada, susceptibilidade pessoal, entre outros. Mas costuma ser cerca de algumas horas”, explica.
Como obter ajuda em casos de violência sexual
Mulheres vítimas de estupro podem buscar os hospitais de referência em atendimento para violência sexual, para tomar medicação de prevenção de ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), ter atendimento psicológico e fazer interrupção da gestação legalmente.
Também é possível conseguir ajuda ligando para o número 180, a Central de Atendimento à Mulher. Funciona em todo o país e no exterior, 24 horas por dia. A ligação é gratuita. O serviço recebe denúncias, indica os especialistas que podem ser procurados e faz encaminhamento para serviços de proteção e auxílio psicológico. O contato também pode ser feito pelo WhatsApp no número (61) 99656-5008.
É recomendável, se possível, que a vítima faça um boletim de ocorrência em uma delegacia da mulher, caso haja essa especialidade na região. Se não, pode ser feito em uma delegacia comum. Mesmo que não consiga se lembrar dos fatos ou indicar um possível agressor, o mesmo homem pode ter feito outras vítimas e, em conjunto com outras denúncias, as autoridades consigam chegar no autor do crime.
Fonte: UOL