Mulheres que ousaram, lutaram pelo voto, se candidataram e ocuparam cargos nos três poderes do Estado brasileiro têm suas histórias retratadas no livro Mulheres no Poder, lançado pela Edições de Janeiro na última sexta-feira.
De Carlota Joaquina e Princesa Isabel, de Luísa Mahin, ex-escrava líder de rebelião e Clara Camarão, índia que lutou contra a invasão holandesa, das líderes feministas como Leolinda Daltro e Bertha Lutz à Presidente Dilma Rousseff, o livro mostra como, por meio da política, da imprensa e da literatura, mulheres saíram “do silêncio dos lares, às universidades e às urnas”. E como vêm combatendo o dogma da “aptidão natural”. Momento mais oportuno não haveria.
No século XIX elas conquistaram o direito de ingressar em cursos superiores. Na década de 1930, foi a vez do direito ao voto. “Mulher votando?”. Como diria Carlos Drummond de Andrade, a novidade que “fez tremer os trilhos da Central”. Inaugurou-se nova era: mulheres ocupando cadeiras no Congresso, na Presidência da República e nos tribunais superiores.
Mas ainda somos maioria com cara de minoria. Essa realidade está ainda enraizada na Justiça Brasileira. No masculinizado universo do Direito, como bem retrata o livro de Shuma Schumaher e Antonia Ceva, mulheres alcançavam o diploma, mas não conseguiam exercer a profissão. “Entre estudar e praticar a advocacia, existia um grande hiato”. Foi o caso de Maria Fragoso, Delmira Secundina da Costa e Maria Coelho Da Silva Sobrinha que em 1888 concluíram o curso de Direito na tradicional Faculdade do Recife, mas se depararam em seguida com as regras patriarcais da época que as impediam de exercer a profissão.
Em 1906 Mirtes de Campos, após 8 anos de batalha, foi a primeira mulher a obter licença para advogar. Mas foi apenas na década de 1950 que mulheres começaram a vestir a toga da magistratura.
A mais alta Corte do país, o Supremo Tribunal Federal, por sua vez, só passou a contar com a presença feminina após 172 anos de existência. Dos 166 Ministros que passaram pela Corte, apenas três mulheres conquistaram o espaço. A Ministra Ellen Gracie foi a primeira, em 2000, seguida das Ministras Cármen Lúcia, em 2006 e Rosa Weber, em 2011. O cargo, porém, não as imunizou do preconceito.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça, a maior parte da magistratura no Brasil é composta por homens, brancos, com idade média de 45 anos. As mulheres representam apenas 36%. Das juízas brasileiras, 30% ainda percebem reações negativas por parte de outros profissionais do sistema de justiça por serem mulheres. Mas este número chega a 57% quando se trata das Ministras dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal Federal.
Esses dados não surpreendem. O verdadeiro fato para o qual temos que voltar às atenções é outro: desde que essas poucas mulheres tomaram posse nas cortes superiores, suas escolhas passaram a contribuir para importantes decisões nos rumos nacionais. Analisando casos relatados pela Ministra Cármen Lúcia, por ser a Ministra que ocupa atualmente cadeira na corte há mais tempo, o da constitucionalidade da importação de pneus usados do exterior, da adoção sem restrição de idade por casais homossexuais, da inexigibilidade de autorização prévia para publicação de biografias são apenas alguns exemplos do passado. No presente, o primeiro caso relacionado à Operação Zelotes – que busca a apuração de fraudes no Carf (órgão da Receita Federal) – está em suas mãos.
O judiciário foi responsável por consagrar importantes avanços para concretização da Democracia brasileira: a política de cotas raciais, o reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo e liberdade de expressão da imprensa, dentre outros. Mas, com relação à igualdade de gênero ainda há muito a se trilhar.
O resgate histórico trazido por Mulheres no Poder se mostra essencial para ampliarmos ainda mais os horizontes de demandas e reivindicações. Ou então, segundo previsão recém-publicada pelo Fórum Econômico Mundial, esperarmos até ao ano 2095 para testemunharmos a consolidação da verdadeira igualdade de gênero no país. Sentadas?
Fonte: Blog do Noblat