A política tradicional, articulada por partidos, empresas e sindicatos, ainda é um ambiente pouco permeável à participação das mulheres, principalmente na sua atuação sobre questões de gênero. Apesar dos avanços, ainda são poucas as que têm efetivo poder de decisão. Apenas olhando para as candidaturas, as mulheres ainda são 28,9% dos que entram na disputa eleitoral.
O problema é que, muitas vezes, as mudanças que queremos dependem de leis (a exemplo da Lei Maria da Penha), políticas públicas (como o parto humanizado na saúde pública) ou criação de órgãos especializados (como a delegacia da mulher). A luta também pode ser reativa: é preciso impedir a criação de políticas equivocadas, vide a proposta dos vagões de trem exclusivos para mulheres. Mas como, em tese, estamos numa democracia, quem ocupa esses cargos públicos deveria ouvir esses pedidos, certo?
Bem, levar as demandas dos cidadãos em geral aos patamares do poder do Estado não é tarefa fácil. Sem mergulhar em todos os problemas que cercam a representação política, a energia despendida para se fazer ouvir normalmente é grande, o que exige tempo, dinheiro, organização e conhecimento da máquina pública. E vamos combinar que nem todas as pessoas podem deixar seus trabalhos, estudos e famílias para recolher assinaturas, participar de audiências ou produzir manifestações.
A boa notícia é que por todos os lados vêm surgindo iniciativas que usam tecnologia para estreitar as ligações entre o povo e as autoridades que decidem a vida comum. Sempre houve trabalho e avanços de movimentos que foram às ruas ou de organizações que batem à porta dos gabinetes, mas de fato a internet vem tendo um papel revolucionário na participação política.
Em parte, a vantagem está no fato de que a comunicação em rede é rápida e difusa. Ela permite trabalho colaborativo sem exigir que as pessoas estejam reunidas no mesmo lugar ao mesmo tempo. Ao dinamizar a troca de informações, o número de pessoas que podem se envolver em uma causa aumenta muito, mesmo que apenas apoiando e propagando.
Mas o destaque é para a quebra das barreiras geográficas que nos separam das esferas de poder. Fazer a mensagem de um grupo mobilizado chegar com força a todos os vereadores de um município ou até à presidenta não tem mais como condição necessária transpor a distância entre cada um de seus membros e a Câmara Municipal ou o Palácio em Brasília.
As ferramentas criadas para potencializar essa participação em rede fornecem um meio para aumentar o poder das mulheres nas decisões políticas. Se as engrenagens enferrujadas de entrada no Estado estão emperrando a representação das causas femininas (o que não significa que devemos desistir delas), a tecnologia, por sua vez, está ampliando os meios de canalizar a pressão sobre as questões de gênero.
A exemplo disso, a Minha Sampa (organização da qual faço parte) busca facilitar a mobilização e empoderar, com suporte da equipe e criação de ferramentas, os cidadãos que querem participar das decisões da cidade. O Panela de Pressão é um dos aplicativos, que permite às pessoas criarem pressão sobre uma causa ao enviar um grande número de mensagens diretamente para governantes, parlamentares, concessionárias de serviços públicos e outros tomadores de decisão.
A história da Minha Sampa começou com uma mobilização ligada às mulheres, na campanha “Abusadores não passarão!”, depois que o Metrô começou uma propaganda inaceitável em que dizia “trem lotado é bom para xavecar mulher”, ainda por cima num momento em que estouravam diversos flagrantes e denúncias de abusos no transporte público.
Com a manifesta indignação da população, a propaganda foi tirada do ar. Mas isso não era o bastante e iniciamos uma pressão para o Metrô investir sua verba pública de comunicação na prevenção ao abuso sexual. Depois de quase 5 mil e-mails em menos de uma semana, o Presidente do Metrô anunciou a criação de uma campanha com panfletos e cartazes incentivando a denúncia desse crime. Pouco tempo depois, foi a vez da mobilização contra a criação do Vagão Rosa.
As ferramentas de visualização de dados também têm um papel de destaque como instrumento das lutas de gênero na política. Um ótimo modelo está no projeto Gênero & Participação, que faz uma análise gráfica da participação feminina na Câmara Federal. Outra visualização que demonstra bem a situação brasileira de inserção da mulher no poder público está no aplicativo Dona Maria, criado durante o Hackathon de Gênero e Cidadania promovido pela Câmara dos Deputados, no final de 2014.
Se não é mais possível pensar o mundo sem internet, não há mais como pensar a democracia sem esses recursos que chegam para fortalecê-la. Ter mais mulheres se apropriando dos instrumentos políticos hoje significa também se apropriar das tecnologias que trabalham com transparência pública e participação social. Felizmente, já estamos fazendo isso!
Fonte/Foto: Brasil Post