A desigualdade de gênero no mercado de trabalho é um tema amplamente discutido e comprovado por diversos dados que demonstram a disparidade nos salários, na ocupação de posições de liderança e nas demais áreas de atuação. Isso reflete não apenas o cotidiano das mulheres no ambiente de trabalho, mas também os valores arraigados na sociedade.
Segundo o relatório do Fórum Econômico Mundial, publicado em 2022, ainda serão necessários 132 anos para que homens e mulheres estejam em condições iguais. O mesmo relatório mostra ainda que o Brasil ocupa a 85ª posição quando se considera o quesito participação das mulheres na força de trabalho.
À primeira vista, pode-se pensar que a desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho é um problema que atinge apenas o setor privado no Brasil. No entanto, o cenário de disparidade é também um dilema na administração pública. Apesar da entrada comum por meio de concurso público, o que se vê é que os diversos cargos de chefia e liderança são majoritariamente ocupados por homens. Isso sem contar a predominância masculina em diversas carreiras, como nas áreas de segurança pública, magistratura e infraestrutura.
Um relatório da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), elaborado em 2018, traz uma boa radiografia sobre como a administração pública vem sendo afetada pela desigualdade de gênero. O estudo analisou dados sobre servidores civis do Poder Executivo Federal, comparando diversos ministérios da Esplanada e mostrando o percentual de mulheres em relação aos homens ocupantes de cargos públicos. Esse indicador, chamado “razão por sexo”, é a quantidade de mulheres dividida pela quantidade de homens em uma determinada categoria.
O relatório revela que a média geral da administração pública federal é de 0,81. Ou seja, a cada 100 homens na máquina pública, temos 81 mulheres – o que deixa claro como ainda há inferioridade numérica de mulheres na Esplanada dos Ministérios.
Nessa análise, podemos ainda perceber a discrepância da presença feminina entre as pastas, sendo o Ministério de Justiça e Segurança Pública com a menor razão (0,26), o que evidencia como ainda há uma forte cultura masculina em determinados setores da administração pública. Já o Ministério dos Direitos Humanos aparece com uma razão bem acima das demais (1,72), devido a presença da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres na pasta, posteriormente transformada em Ministério da Mulher.
O relatório da Enap também analisou a evolução da remuneração média entre homens e mulheres. Pelos dados, pode-se perceber que a diferença salarial vem caindo ao longo do tempo, mas ainda é substancial, ficando no patamar acima dos 10%. Outro ponto que chama atenção é o percentual de mulheres ocupando cargos de DAS (Direção e Assessoramento Superior), que podem variar de 1 a 6. Quase 50% das mulheres ocupam cargos menores (DAS 1, 2 ou 3) e menos de 20% delas têm DAS 6.
De fato, essa radiografia da administração pública nos mostra que ainda há muito o que avançar dentro das repartições. Os dados jogam luz à questão da desigualdade de gênero e apontam como é urgente ampliar o acesso das mulheres a posições de liderança.
Uma forma de atingir esses objetivos é a realização de processos seletivos para cargos de liderança na administração pública. Essa iniciativa é um bom exemplo de modernização da burocracia, pois elimina a prática de indicação política aos cargos, o que historicamente favoreceu a desigualdade de gênero, como foi bem demonstrado nos dados da Enap. Para alcançarmos maior equidade, os processos seletivos poderão reservar vagas ou criar quesitos de pontuação para incentivo da ocupação por lideranças femininas.
Março é sempre um período fértil para pensar a participação das mulheres na sociedade. Precisamos aproveitar este momento e impulsionar o debate sobre desigualdade de gênero no serviço público, pauta que não pode mais ser adiada. O país só tem a ganhar com a potência feminina de servidoras em cargos de liderança. Que mais mulheres cheguem ao topo!