O TCU (Tribunal de Contas da união) realizou um estudo inédito e inovador sobre assédio moral e sexual na administração pública federal. Entre as descobertas, um levantamento identificou que, “em 49 processos disciplinares para apurar assédio sexual, cerca de dois em cada cinco (38,78%) resultaram na aplicação de algum tipo de penalidade disciplinar”.
Ou seja, em 61,22% dos casos, não houve qualquer sanção ao denunciado. Além disso, o levantamento sobre assédio sexual identificou o que as mulheres já sabem no seu dia a dia: “em 100% dos casos analisados o assediador era do sexo masculino. Entre as vítimas de assédio sexual, houve predominância do sexo feminino (96,5%)”.
No que tange ao assédio moral, a TCU indicou que “foram selecionados 270 processos disciplinares, instaurados no período de 2014 a 2018”. Desses, apenas 54 (20%) resultaram na aplicação de uma sanção disciplinar, e 164 ocorrências (60,74%) foram arquivadas.
Dessa pesquisa, surgiu o relatório “Levantamento do Sistema de Prevenção e Combate ao Assédio Moral e Sexual” disponível no site do TCU. A publicação é de 2022 e oferece à administração federal um modelo para que órgãos públicos saibam lidar com casos de assédio. A ideia agora é realizar uma auditoria, no futuro, para avaliar o desempenho do sistema proposto no relatório.
E por que um tribunal de contas está preocupado com assédio? Para além de uma posição extremamente ética com a saúde e segurança de servidores e servidoras, a corte sabe que assédio, além dos danos e custos causados às vítimas e ao ambiente de trabalho, custa aos cofres públicos, seja pelo aumento do número de faltas, causado pelo adoecimento das servidoras e servidores alvo de assédio, seja pelos pagamentos de indenização e custas judiciais de processos indenizatórios promovidos por vítimas.
De acordo com reportagem publicada pelo “Brazilian Report” e assinada pela jornalista Amanda Audi, esses custos estão aumentando. Ao analisar os dados da Controladoria Geral da União, a jornalista descobriu que os casos de assédio sexual cresceram gradativamente desde 2016, quando esses dados passaram a ser registrados.
Até junho deste ano, houve mais de um caso de assédio sexual por dia na administração pública federal, em um total de 238 casos, significando um aumento de 126% de denúncias em comparação com o mesmo período de 2021.
Como já sabemos, não é fácil ser mulher no Brasil. Sermos incluídas no mercado de trabalho não basta para sermos tratadas com igualdade. É preciso empenho das instituições, públicas e privadas, para que o nosso dia a dia seja digno, seguro e profícuo como é o dia a dia dos homens que trabalham.
Essa segurança pode e deve ser balizada por parâmetros claros do que é assédio, uma vez que ainda é muito comum que as pessoas acusadas se defendam alegando que era apenas um elogio ou que foi só um dia ruim que as fez tratar mal seus subordinados. Existe uma mítica muito forte de que o assédio não pode ser provado ou identificado porque ele é velado ou porque não há indícios contundentes do que é ou não considerado assédio.
O modelo do TCU tira o véu desse assunto e traz indicações explícitas do que deve ser feito para prevenir crimes, acolher vítimas e responsabilizar agressores. Já passa da hora do assunto ser tratado para além da formalidade de políticas que não são efetivamente aplicadas ou por meio de canais de denúncia que não acolhem e, pior, vazam informações das vítimas. A responsabilidade ativa e preventiva das instituições não pode mais ser uma escolha, mas sim uma obrigação.
Fonte: Universa Uol