Quando tinha apenas 3 anos, a professora Gisele Nascimento, hoje com 33, surpreendeu os pais ao mostrar que já sabia ler e escrever. Antes dos 10, outra surpresa: já havia aprendido, por conta própria, a falar inglês, alemão, espanhol, italiano e francês. As conquistas intelectuais sempre fizeram parte de sua vida. Com cinco graduações, duas especializações e duas pós, Gisele já passou em mais de 15 concursos públicos e, atualmente, é professora e coordenadora da primeira clínica-escola pública do Brasil, que fica em Itaboraí, na Região Metropolitana do Rio. Um pequeno detalhe em meio a tudo isso: ela tem síndrome de Asperger, um tipo de autismo brando.
Filha de um estivador e de uma empregada doméstica, Gisele ficou sem falar dos 7 aos 8 anos por causa do diagnóstico tardio do autismo.
— Não tinha amigos, e as pessoas no colégio caçoavam muito de mim. Sempre tive que lidar com o preconceito até a fase adulta, mesmo na faculdade — lembra a professora, que é casada e mãe de um casal de filhos.
Formada em Sociologia, Pedagogia, Biologia, Segurança Pública e Psicologia, Gisele conta que aprendeu a ler e a escrever sozinha com os livros que o pai comprava em sebos:
— O grande diferencial da minha vida é que meus pais me proporcionaram um ensino público de qualidade.
Outra grande barreira que Gisele precisou enfrentar foi esconder que era autista nos mais de 15 concursos que prestou e passou.
— Como o preconceito é muito grande, eu não contava que era autista. Isso era muito ruim para mim. Quando descobri que a Prefeitura de Itaboraí havia aberto vagas para um concurso público para trabalhar com crianças autistas, tudo mudou. Comecei a atuar em 2011, e a gente tem conseguido muitas conquistas — explica a coordenadora, que atende mais de dez alunos na clínica-escola.
Um exemplo a seguir
Localizada no bairro Venda das Pedras, a clínica-escola para autistas, coordenada pela professora Gisele, atende 115 pessoas de diversas idades, com neuropediatra, nutricionistas, psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, orientadores e pedagogos especialmente capacitados.
Segundo a própria professora, representantes de outras prefeituras já visitaram a instituição, interessados em implementar o projeto. O objetivo é preparar os autistas para a inclusão na escola regular e formar profissionais aptos a lidar com a síndrome.
— O autismo é uma deficiência que precisa ser exaustivamente estudada por educadores, terapeutas e médicos. É fácil reverter comportamentos inadequados e alfabetizá-los, mas só conseguem profissionais que despendem dias entre prática e teoria — orienta Gisele, que nasceu em Meriti, na Baixada Fluminense.
Para que mais profissionais estejam preparados para lidar com alunos com algum grau de autismo, a Prefeitura de Itaboraí, em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF), está capacitando 150 professores concursados da Educação Infantil do município. O objetivo, segundo Gisele, é fazer com que esses professores aprimorem suas práticas de ensino, visando a oferecer melhores condições de estudo aos alunos autistas da rede municipal:
— Quanto mais cedo acontecerem intervenções pedagógicas, melhores serão os resultados. Mas isso depende de professores capacitados.
Fonte: Extra