Este ano, com a chegada do Dia Internacional da Mulher, resolvemos abordar questões sobre os direitos sexuais e reprodutivos, que incluem o direito de tomar decisões sobre a reprodução, de ter acesso à informação e à saúde pública de qualidade e de exercer a sexualidade livre de violência, discriminação e coerção. Assim, vamos tratar de temas relacionados à pílula do dia seguinte, aos métodos contraceptivos, à laqueadura e à interrupção da gravidez, assuntos constantemente requisitados pelo público do nosso site e redes sociais e que despertam muitas dúvidas nas leitoras.
A pílula do dia seguinte, cujo nome correto é contraceptivo de emergência, é um dos assuntos mais pesquisados em nosso site, e é uma importante ferramenta para evitar uma gravidez não planejada e abortos inseguros.
Desde o início do ano, a matéria “Pílula do dia seguinte: perguntas e respostas” foi acessada por quase 110 mil pessoas, e são frequentes as perguntas sobre o acesso ao medicamento.
Você sabia que, desde 2012, é possível conseguir o contraceptivo de emergência em qualquer unidade básica de saúde, sem que seja necessário passar por uma consulta ou ter receita médica? Pouca gente sabe disso.
Para fazer o cálculo de quantos contraceptivos de emergência disponibilizar nas unidades de saúde, o Ministério da Saúde utiliza a taxa de 2% da população feminina em idade fértil (15 a 44 anos) . Atualmente, são distribuídas mais de 500 mil doses anuais do medicamento no país via Secretarias Municipais de Saúde (enviados diretamente a municípios com mais de 100 mil habitantes e via Secretarias Estaduais de Saúde a municípios menores).
No estado de São Paulo, com mais de 7 milhões de mulheres em idade reprodutiva em 645 municípios, a oferta da pílula do dia seguinte está incluída no cuidado à saúde. Na verdade, poucas brasileiras têm conhecimento dessa informação, tanto é que quando necessitam do medicamento, dificilmente recorrem ao SUS.
Regina Figueiredo, pesquisadora Científica e Coordenadora de Projetos em Saúde Sexual e Reprodutiva e Prev. Violência e Drogas do Instituto de Saúde – Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, explica que nas farmácias, apesar de ter de pagar cerca de R$ 15,00 a R$20,00, é fácil conseguir o contraceptivo. A mulher de qualquer faixa etária chega, pede o medicamento, paga e sai. Não à toa, 80% da aquisição das pílulas do dia seguinte é feita nesses estabelecimentos.
As unidades de saúde, por sua vez, em geral estão instaladas em bairros, onde as pessoas têm um convívio próximo, e normalmente não são frequentadas por adolescentes. “Então, quando a comunidade vê a jovem ali, já logo supõe que ela está atrás de camisinha ou de pílula do dia seguinte. Enfim, um pensamento conservador, mas que está por trás do constrangimento das meninas em ir a esses espaços públicos”, afirma Regina.
Nos serviços públicos de saúde está disponível gratuitamente o levonorgestrel de 0,75mg, que deve ser utilizado em até cinco dias após a relação sexual (lembre que não é necessário esperar até o dia seguinte para tomar o medicamento, ao contrário, quanto mais próximo da relação sexual desprotegida a mulher tomar a pílula, maior sua eficácia).
Teoricamente, a mulher deveria chegar ao posto, fazer a solicitação do contraceptivo de emergência à atendente, que encaminharia o pedido para a enfermeira. A profissional forneceria o medicamento e daria algumas dicas básicas sobre seu uso. Só que o caminho para obter a medicação, muitas vezes, não é tão simples assim.
Nossa repórter fez uma rápida pesquisa para ver como poderia conseguir o medicamento. Ela chegou à UBS Jardim das Oliveiras, na cidade do Taboão do Serra, SP, por volta das 10 horas da manhã, durante um dia de semana. Fez a solicitação e como resposta ouviu: “A gente não tem isso aqui, não”. Não convencida, foi até a sala de medicação e perguntou diretamente para a chefe de enfermagem se havia o remédio. Esta respondeu que sim. Questionada sobre o mal-entendido com a outra enfermeira, a funcionária deu a entender que elas poderiam não saber direito como proceder.
A chefe de enfermagem perguntou à repórter quanto tempo havia passado desde a última relação sexual e deu algumas orientações sobre o uso do medicamento. Tudo estava indo bem, até ela pedir o prontuário da paciente. Como a repórter não tinha ficha na unidade, deveria abrir uma na recepção. Entretanto, a fila estava enorme e ela acabou optando por não pegar o medicamento.
“Nos treinamentos que realizamos com os profissionais das unidades de saúde, nós sempre orientamos que o fornecimento desses medicamentos deve ser o mais simples e eficiente possível. Não existe isso de exigir prontuário, e o profissional de saúde não deve fazer julgamentos. A enfermeira citada não precisava ter agido assim. Mas o que acontece é que cada posto acaba seguindo uma conduta própria”, explica Regina.
Por isso, a informação é um grande instrumento para a mulher. Se ela não tiver consciência do direito de obter gratuitamente a medicação, pode acabar indo embora do posto, correndo o risco de que o intervalo entre o sexo desprotegido e a contracepção aumente. Desse modo, o risco de uma gestação indesejada torna-se maior.
A pílula do dia seguinte pode ser muito útil para evitar uma gravidez, no entanto deve ser usada como último recurso. É importante salientar que ela nunca deve substituir métodos contraceptivos tradicionais como a camisinha, que além de evitar a gravidez, protege contra doenças sexualmente transmissíveis.
*Colaboração da repórter Luana Viana.
Fonte: Site Dr Drauzio